Resumo

Esse trabalho objetiva discutir sobre a outra face da gestão tratada no livro “Gestão como doença social”, de Gaulejac, por meio de uma análise do filme Gattaca – A Experiência Genética. Bem como no filme, o livro distingue os válidos dos inválidos, sendo esses últimos aqueles que não conseguiram alcançar o desempenho satisfatório dentro das organizações exigido pela ideologia gerencialista. Essa ideologia, marcada pelo triunfo da racionalidade instrumental, sequestra a subjetividade dos sujeitos, transformando-os em meros utensílios.

Qual é a outra face da gestão ditada pelo discurso gerencialista? Esse trabalho objetiva discutir sobre a outra face da gestão tratada no livro “Gestão como doença social”, de Gaulejac, por meio de uma análise do filme Gattaca – A Experiência Genética.

Por meio do trabalho o sujeito se desenvolve e se afirma (GAULEJAC, 2007). Entretanto, por outro lado, o trabalho representa fonte de sofrimento e desgaste. Para Linhares (2014), a ideologia gerencialista se difundiu em um mundo líquido, caracterizado pela incerteza e é marcada pelo empoderamento do mercado e secundarização dos homens. A cifra da excelência traz como consequências a primazia da técnica sobre o humano, transformando os seres humanos em recursos materiais a favor do capitalismo. Não há espaço para subjetividade, pois essa não pode ser medida. (ENRIQUEZ, 1997; GAULEJAC, 2007).

De acordo com Goliot-Lété e Vanoye (1992) citado por Assis et. al (2016), o filme é um produto cultural inserido num contexto socio-histórico e fornece representações que remetem direta ou indiretamente a sociedade na qual se inscreve. Assim, o filme pode ser considerado uma representação da sociedade. Para Charaudeau (2006), essas representações midiáticas apontam para um desejo social, produzem normas e revelam sistemas de valores (CHARAUDEAU, 2006. p. 47). Será utilizada a análise de discurso seguindo os conceitos de CHARAUDEAU (1983, 2001).

O sistema capitalista tem como finalidade transformar cada indivíduo em utensílio adaptado à empresa. Para ser válido, é preciso estar sempre acima das expectativas (GAULEJAC, 2007). O filme apresenta a sociedade dividida entre os válidos e os inválidos. O imaginário do sucesso leva cada um a querer ser o melhor (GAULEJAC, 2007, p. 84). Vincent tinha o sonho de ir para o espaço e para isso precisaria ser aceito na Gattaca. Para Linhares (2014), a empresa estimula um desejo de afirmação narcísica, que ocupa o espaço psíquico das pessoas.

Foi possível fazer diversos relacionamentos entre filme e teorias, dentre eles, como a distinção entre os válidos e inválidos, o culto aos campeões, a doença da medida e a mercantilização do ser humano. A contribuição do trabalho é trazer a tona a reflexão sobre esse discurso gerencialista que afeta as instituições sociais, desde a família, a política, e até mesmo o espaço psíquico do sujeito a seu favor. Sugere-se assim uma recusa a esse sistema que aliena, adoece e mata. O trabalho é fonte de prazer e sofrimento, entretanto ele deve ser apenas uma esfera da vida humana, e não o contrário.

CHARAUDEAU, P. Discurso das mídias. São Paulo: Contexto, 2006. ENRIQUEZ, E. Os desafios éticos nas organizações modernas. Revista de Administração de Empresas, v. 37, n. 2, p. 6-17, 1997. GAULEJAC, V. de. Gestão como doença social: ideologia, poder gerencialista e fragmentação social. São Paulo: Ideias e Letras, p. 7-142, 2007. LHUILIER, Dominique. Introdução à psicossociologia do trabalho. Cadernos de Psicologia Social do Trabalho, v. 17, n. SPE, p. 5-20, 2014.