Resumo

Um dos desafios que persistem para se alcançar a igualdade entre homens e mulheres no mundo do trabalho se refere à baixa representatividade feminina em cargos de comando, especialmente nos níveis executivos das organizações (e.g. Shen & Joseph, 2021; Lyness & Grotto, 2018). Essa situação se agrava em setores de STEM. Um exemplo de manifestações sutis que caracterizam o preconceito que a mulher enfrenta atualmente, especialmente nesses setores, capazes de gerar profundas consequências em suas carreiras, são as microagressões (Kim & Meister, 2023).

A pesquisa objetiva compreender fatores desfavoráveis à ascensão hierárquica de mulheres em uma empresa de tecnologia mediante a análise de sua conjuntura organizacional bem como das carreiras de mulheres que alcançaram posições de liderança em relação às razões para que não tenham avançado hierarquicamente. As análises são realizadas à luz da ótica do desenvolvimento da identidade de líder como resultado de dinâmicas relacionais (DeRue & Ashford, 2010) e do entendimento de que barreiras organizacionais podem atuar para impedir a ascensão feminina (e.g. Lyness & Grotto, 2018).

A discriminação a mulheres líderes em setores STEM pode se manifestar nas relações interpessoais em seus cotidianos na forma de micro agressões quase sempre sutis e breves (Capodilupo, et al., 2010). Essas agressões atuam no sentido de torná-las invisíveis ou altamente visíveis (Kim & Meister, 2023). O processo de constituição da identidade de líder é caracterizado por um forte aspecto relacional (DeRue & Ashford, 2010). Práticas e decisões discriminatórias na área de RH são potencialmente as mais nocivas ao trabalho das mulheres (Stamarski & Hing, 2015).

Foi realizado um estudo de caso qualitativo em uma perspectiva longitudinal com corte transversal (Vieira, 2004). Participaram da primeira etapa da pesquisa (em 2006), além do gerente de Recursos Humanos, dez funcionárias de diversos cargos e setores. Na segunda etapa ocorrida em 2021, foram entrevistadas cinco ex-funcionárias da organização que se constituíram como líderes durante suas trajetórias na empresa e que não ascenderem a cargos executivos. Novamente, buscou-se contemplar profissionais oriundos de variados setores de atuação, inclusive de áreas de staff e de linha.

Na primeira etapa, foram identificados diversos fatores que caracterizam uma conjuntura organizacional discriminatória em relação à ascensão de mulheres. Na segunda etapa, observou-se que foram desfavoráveis à ascensão das entrevistadas os seguintes fatores: a postura segregadora da alta cúpula; a oposição de parte dos pares, subordinados e clientes a mulheres líderes; vieses nas políticas e práticas de gestão de recursos humanos; e o conservadorismo na cultura organizacional.

Os resultados da primeira etapa, retrataram um contexto organizacional consideravelmente desfavorável para mulheres desenvolverem suas lideranças e ascenderem na empresa. A análise das trajetórias individuais das profissionais pesquisadas da segunda etapa demonstrou que fatores relacionais em conjunto com organizacionais contribuíram para que elas não avançassem em suas posições de liderança.

DeRue, D. S., & Ashford, S. J. (2010). Who will lead and who will follow? Social process of leadership identity construction in organizations. The Academy of Management Review, 35(4), 627-47. Lyness, K. S., & Grotto, A. R. (2018). Women and leadership in the United States: Are we closing the gender gap?. Annual Review of Organizational Psychology and Organizational Behavior, 5, 227-265. Kim, J.Y., Meister, A. (2023). Microaggressions, Interrupted: The Experience and Effects of Gender Microaggressions for Women in STEM. J Bus Ethics 185, 513–531.