Resumo

À beira de um colapso, provocado por esse sistema, a humanidade se defronta com os limites desse modelo e com as possibilidades de soluções (Banerjee, 2003, 2008; Leff, 2015; Martinez-Alier et al., 2014; Vizeu, Meneghetti & Seifer, 2012). Isso imputa às organizações, grupos e movimentos sociais a difícil tarefa de lidar com os chamados “grandes desafios” das sociedades contemporâneas (Colquitt & George, 2011; George et al., 2016; Ferraro, Etzion & Gehman, 2015), que não surgem de modo espontâneo; são fruto de construção social sobre o que é considerado importante ao longo do tempo.

O problema que norteia a investigação deste artigo é: como ocorre o processo de construção do valor social sustentabilidade? Objetivando compreender como ocorre esse processo, localizamos uma organização não governamental (ONG) que luta pela preservação do meio ambiente a partir de campanhas globais ligadas à sustentabilidade socioambiental. As evidências empíricas da pesquisa foram provenientes de estudo de caso qualitativo, construído a partir da combinação de diferentes fontes de dados (entrevistas qualitativas, observações participantes e documentos consultados), de 2019 a 2020.

Ao identificarem a existência de três tipos de estruturas sociais (estruturas grandes, intermediárias e próximas), os interacionistas estruturais apontam para uma relação macro-micro que fornece o contexto em que se constroem os valores sociais. Ao integrarmos as visões micro e macrossociológica do interacionismo simbólico, chegamos à uma conceituação atualizada de valor social entendido como qualquer dado com conteúdo empírico acessível, significado atribuído e passível de atividade por agentes situados em estruturas sociais próximas permeadas por estruturas sociais intermediárias e grandes.

A presente pesquisa tem como fundamentos: i) o método abdutivo (Dubois & Gade, 2002), ii) a abordagem qualitativa (Merriam & Grenier, 2019), iii) a estratégia de pesquisa estudo de caso - combinação de observação participante, pesquisa documental e entrevistas (Godoy, 1995; Godoy & Balsani, 2010), e iv) análise de dados por categorias (Gibbs, 2009) e narrativas compostas (Sonenshein, 2010). O caso que foi analisado nesta pesquisa trata-se de uma ONG internacional (com sede em país europeu e unidades no Brasil) que atua em questões relacionadas à preservação ambiental, denominada aqui de ECO.

O processo de construção social do valor sustentabilidade nos mostrou que, por meio do imbricamento entre diferentes atores sociais (individuais e coletivos), esse valor vem sendo construído por um processo que se iniciou com algumas atividades esparsas de sinalização da finitude dos recursos naturais (e suas possíveis consequências negativas) até se chegar à necessidade de estabelecer a ideia de ‘capacidade de sustentação de recursos’ (ecológicos, sociais, econômicos) ao se constatar que era algo inexistente e que vai além da contestação da falta de preservação.

Podemos pensar que certos valores sociais abstratos surgem a partir de “fissuras” em valores sociais mais duradouros, em função das consequências das atividades que foram feitas em sua direção e que não estão produzindo a finalidade original esperada (no caso do capitalismo, o bem comum). Assim, trazer à luz processos sociais, como a construção social de valores, torna explícito o que está implícito, possibilita a compreensão de situações que parecem surgir repentinamente (como a pandemia), e evidencia manipulações e jogos de poder, mergulhando na complexidade da realidade social.

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