Resumo

Parece haver consenso sobre os paradoxos psíquicos, físicos e sociais que o trabalho encerra, quer seja para os indivíduos, quer para a sociedade, já que ele traz em seu cerne tanto o prazer (influenciando a formação da identidade do trabalhador, contribuindo para sua saúde) como desencadeia processos de adoecimento e sofrimento físico-psíquico (quando o contexto laboral é desgastante e conflituoso) (MENDES; MÜLLER, 2013). Buscando mediar os sentimentos de sofrimento e injustiça, é possível que o trabalhador busque desenvolver estratégias de defesa, dentre as quais as atitudes retaliatórias.

Tomando como ponto de partida a discussão sobre os construtos prazer, sofrimento e retaliação no trabalho, essa investigação preocupou-se com um grupo de trabalhadores em específico, qual seja, o dos garis, cuja atividade volta-se principalmente à coleta de lixo. A presente orientou-se pelo seguinte problema de pesquisa: como se dão as vivências de prazer, sofrimento e retaliação no trabalho de garis?

O referencial teórico que deu suporte ao estudo procurou articular três construtos principais, quais sejam: prazer, sofrimento e retaliação no trabalho. Para tanto, tomou-se como referência a psicodinâmica do trabalho, mais especificamente Dejours (2004, 2007, 2014), além de autores como Mendes (2001, 2007), Torres (2020), dentre outros.

Considerando a pergunta de pesquisa e os objetivos específicos propostos para este estudo, entendeu-se ser necessário adotar uma abordagem qualitativa. Os participantes da pesquisa foram os garis prestadores de serviço à Prefeitura Municipal de Maceió, trabalhadores da empresa Via Ambiental. Optou-se por esse grupo de participantes, principalmente por pressupor que eles tenham uma visão privilegiada do fenômeno. Foram realizadas quatorze entrevistas , orientadas por um roteiro adaptado de Torres (2020). A análise de conteúdo (AC) foi o procedimento utilizado para análise dos dados.

Especificamente sobre fatores que dão prazer no trabalho, os mais citados foram a ambiência e os colegas, o reconhecimento pelos colegas, o cumprimento das tarefas, a possibilidade de dar uma vida melhor para a família e filho, o trabalho viabilizando a comida e o pagamento de contas/dívidas. Dentre os fatores que trazem mal-estar ou sofrimento do trabalho foram destacados pelos entrevistados problemas com colegas, o não cumprimento de tarefas, conversas paralelas e fofocas, preconceito sofrido na rua. A maioria afirmou apontou situações de injustiça mas sem assumir retaliação.

Em resposta ao objetivo de pesquisa proposto, os dados evidenciaram que prazer e sofrimento caminham juntos na rotina dos garis. Em se tratando de retaliação, os dados mostraram que a questão salarial, o preconceito sofrido no dia a dia são situações que despertam neles a percepção de injustiça. Ainda nessa perspectiva, o elemento afetivo da retaliação mostrou-se predominante, ainda que vários deles adote a estratégia de negar o sofrimento vivenciado no ambiente de trabalho.

BARRETO, L. K. S.; LEONE, N. M. C. P. G.; SANTIAGO, J. L. S.; NÓBREGA, A. B. N. Trabalho, Prazer e Sofrimento na Hotelaria. Revista Pensamento Contemporâneo em Administração, v. 10, n. 4, p. 63-79, 2016. DARIO, V. C.; LOURENÇO, M. L. Cultura Organizacional e Vivências de Prazer e Sofrimento no Trabalho: Um Estudo com Professores de Instituições Federais de Ensino Superior. Revista Organizações em Contexto, v. 14, n. 27, p. 345-395, 2018.