Resumo

Inúmeras pesquisas exploram como acontecimentos importantes da história produzem impactos na sociedade e alteram as relações e os sentidos do trabalho. A adoção do home office obrigou profissionais de diferentes a se adaptarem de forma repentina a nova realidade. Tal fenômeno trouxe uma nova roupagem as discussões sobre o conflito trabalho-família. Em um cenário pandêmico, onde a prática docente migrou para o ambiente remoto, é preciso investigar como professoras percebem o exercício profissional, que naturalmente já permeia a vida privada, e o tempo para o lazer e convívio familiar.

A prática docente, se comparada a outras profissões, possui fronteiras mais porosas com outras esferas da vida.(CARLOTTO; CÂMARA, 2014). Professores do ensino superior convivem com pressão contínua relacionada a qualidade das aulas ministradas, carga horaria de trabalho elevada, produção escrita, cumprimento de prazos e participação em eventos acadêmicos (JOHNSON; WILLIS; EVANS, 2019). Diante do exposto, o presente estudo explora como professoras universitárias em João Pessoa-PB perceberam o equilíbrio entre vida pessoal e a prática docente no ensino remoto durante a pandemia da Covid-19?

A atividade do professor demanda competências e preparo muito superior ao tempo dedicado em sala de aula. Vasques-Menezes e Gazzotti (1999) afirmam que o trabalho do professor é altamente exigente e com frequência compromete o tempo de lazer e o convívio com a família. Neste estudo, será adotado o conceito proposto por Kalliath e Brough (2008) ao definirem o equilíbrio trabalho e vida pessoal como “a percepção individual de que as atividades profissionais e não profissionais são compatíveis e promovem o crescimento de acordo com as prioridades de vida atuais de um indivíduo" (p.326).

Optou-se por um estudo qualitativo com abordagem exploratória-descritivo diante da necessidade de se trabalhar com significados, motivos, aspirações, crenças e atitudes (MINAYO,2007).A coleta dos dados foi realizada por meio de entrevistas semiestruturadas por oferecer respostas mais livres e não condicionadas a uma padronização de alternativas (MANZINI, 2003). As entrevistas foram realizadas no mês de dezembro de 2021 e aconteceram via videoconferência, foram gravadas e posteriormente transcritas na íntegra e analisadas por meio da análise de conteúdo (BAUER; GASKELL,2002).

O primeiro ponto que merece destaque trata-se do aumento do volume de trabalho relatado por todas as entrevistadas. Alterações de espaços e nas rotinas familiares também são percebidas. Contudo, para algumas professoras, não foi apenas o volume de trabalho e o uso da tecnologia que mudou, mas o sentido e significado do trabalho. A Covid-19 também pode ter contribuído para a flexibilização das relações e precarização do trabalho. Sentimentos de ansiedade e solidão também aparecem nos relatos. É possível observar ainda características de situações de enriquecimento na relação trabalho-família.

Pode-se concluir que houve um aumento do volume de trabalho e para algumas entrevistadas isso resultou na potencialização do conflito (ROMAN, 2017), sobretudo para as profissionais com filhos, semelhante ao estudo desenvolvido por Lemos, Barbosa e Monzato (2020). Contudo, é possível identificar entrevistadas que vivenciaram a relação trabalho-família de formas diferente. Diferenças nessa percepção estão ligadas a configuração familiar, percepções e experiências prévias. É possível constatar ainda, a independência de situações de conflito e enriquecimento acontecendo simultaneamente.

ÇOBAN, S. Gender and telework: Work and family experiences of teleworking professional, middle-class, married women with children during the Covid-19 pandemic in Turkey. Gender, Work & Organization, v. 29, n. 1, p. 241-255, Apr. 2021. GAETA, C.; MASETTO, M. O professor iniciante no ensino superior: aprender, atuar e inovar. São Paulo: Senac, 2013. GRAGNANO, A.; SIMBULA, S.; MIGLIORETTI, M. Work-Life Balance: Weighing the Importance of Work-Family and Work-Health Balance. International Journal of Environmental Research and Public Health, v. 17, 02 2020.