A notoriedade econômica e cultural da indústria de games e, especificamente, a dos e-Sports, é um ambiente em que discursos sociais são assimilados e reproduzidos por diferentes agentes mercadológicos. Por consequência, assimetrias sociais são incorporadas e ressignificadas no ambiente de interação dos jogadores. O artigo adota a teoria de Judith Butler como lente crítica para compreender como o consumo de feminino de e-Sports produz performatividades de gênero.
Os crescentes dos números dos e-Sports, em audiência e praticantes, se sobrepõem ao aumento de interesse do público feminino consumidor neste produto cultural. Contudo, esse novo alcance ainda reproduz assimetrias sociais e discursos que há muito são característicos do cenário dos games, quanto a inferiorização de gênero. Nesse sentido, a pesquisa objeta por analisar a percepção do público feminino de e-Sports não apenas sobre sua experiência nos jogos e no cenário cultural em si, já que o arranjo social de consumidores do produto cultural é composto por praticantes e entusiastas de games.
A concepção de performatividade de gênero proposta pela filósofa Judith Butler é articulada no estudo como uma forma em que discursos mercadológicos são capazes de propagar e contestar assimetrias sociais através de práticas de consumo. Especificamente, reforçamos como interações de consumidores sobre objetos produzidos pela indústria do entretenimento (e.g., e-Sports) funcionam como arranjo social em que discursos que reproduzem a diferenciação por gênero.
A pesquisa realizou fez uso de uma adaptação das longas entrevistas propostas por McCracken, quando, seguindo uma noção naturalista, trinta e seis jogadoras que são parte ativa da cultura de e-Sports nas redes sociais foram acessadas. As conversas foram transcritas e tratadas através de uma Análise de Conteúdo Reflexiva (ACR), de modo que os dados foram codificados, traduzindo as respostas dos entrevistados, categorizados, contextualizados via leituras interdisciplinares da cultura do consumo e dimensionalisados, à luz da teoria de Judith Butler.
Duas dimensões foram identificadas: "Lute como uma garota!" e "Garotas só querem se divertir!". A primeira reflete a prática mais notória entre as performatividades de gênero, quanto a luta ativa de mulheres para estabelecer um espaço equalitário entre os gênero no cenário de interação de consumidores de e-Sports. A segunda indica como a performatividade de gênero se manifesta muito mais em hábitos, do que na socialização, quando jogadoras optam por se omitir às lutas de gênero por considerar que devem priorizar a experiência hedônica do consomo de e-Sports.
O estudo apresenta como performatividades de gênero dispares, quando não executadas com o devido cuidado, mais funcionam como reprodutores e propagadores do discurso de gênero. Este, em última instância é um dispositivo de poder completo que nos conduz a uma sociedade patriarcal.
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