Resumo

Título do Artigo

PERFORMANDO O ACESSO, OBSERVANDO, PARTICIPANDO E CONSTRUINDO DADOS: NOTAS DE UMA PESQUISA DE CAMPO.
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Palavras Chave

Pesquisa de campo
Etnografia
Acesso

Área

Ensino e Pesquisa em Administração

Tema

Métodos e Técnicas de Pesquisa

Autores

Nome
1 - Leonardo Lemos da Silveira Santos
UNIVERSIDADE FEDERAL DE JUIZ DE FORA (UFJF) - ICSA - Governador Valadares

Reumo

No artigo discuto a questão do acesso em pesquisa etnográfica partindo da noção de que ele não é algo que se obtém, que se consegue, mas sim um processo que vai sendo obtido ao longo do trabalho de campo. Ele não se limita à autorização formal para acessar espacialmente a organização, vai além incorporando as possibilidades de se conversar com pessoas, acompanhar eventos, manusear documentos, percorrer instalações no dia-a-dia da pesquisa. No campo o pesquisador se vê sempre diante da necessidade de (re)negociar o acesso a cada nova situação, evento, pessoas e cenários com os quais se depara.
De maneira geral o objetivo é compartilhar aspectos de um trabalho de campo para mostrar nuances de como uma pesquisa etnográfica em organizações é feita na prática. Acredito que esforço de compartilhar nossas vivências é crucial para refletirmos sobre nossa prática de pesquisa atual e futura. Especificamente procuro descrever como as minhas possibilidades de observação, de participação e, consequentemente de construção de dados e de compreensão, ampliavam-se na medida em que o meu acesso era performado dia-a-dia com diferentes atores da pesquisa em diferentes situações/cenários no campo.
A etnografia é caracterizada pelo encontro direto do pesquisador com os pesquisados no tempo e no espaço em que vivem e que fornece o combustível para o conhecimento que o etnógrafo constrói (Ybema et al, 2009; Rosen, 1991; Van Maanen, 1988). Conhecimento que não se acha na biblioteca, mas é construído no mundo real no encontro entre pessoas que se estranham (pesquisador-nativo) e que fazem um movimento de aproximação (Cunliffe, 2010; Malinowski, 1976). Daí a importância de uma visão ampliada do que é o acesso. Esse tipo de encontro não se garante apenas pelo acesso formal à organização.
Narro aqui uma experiência em primeira pessoa, de forma confessional (Van Maanen, 1988), que foi vivida durante uma pesquisa de campo. Interessado em investigar como uma “Oficina” se organizava, acontecia na prática em meio a um conjunto de práticas e arranjos materiais (Schatzki, 2002, 2006, desenvolvi um trabalho de caráter etnográfico lastreado em 6 meses de observação/participação direta. Para este texto li, reli, e codifiquei minhas notas de campo segundo as categorias “observação, participação, acesso e construção de dados” (Spradley, 1979; Locke, 2001; Goulding, 2002; Charmaz, 2006).
A observação/participação são componentes centrais da pesquisa etnográfica. É através delas que o pesquisador se envolve na vida cotidiana das pessoas que pretende estudar e constrói os seus dados. Mas o acesso privilegiado ao dia-a-dia dos “pesquisados” não flui simplesmente porque o pesquisador está autorizado a estar lá. Ele precisa ser performado. No texto mostro como isso aconteceu na minha prática de pesquisa. Aponto como as “reuniões de abertura”, o sujar do uniforme, o bloco de notas utilizado, a organização do almoxarifado contribuíram para o tipo de acesso que desenvolvi no campo.
O acesso ao campo vai além de conseguir a autorização formal da cúpula da organização para estar lá. É, isso sim, um processo que envolve a constante (re)negociação com os pesquisados, da presença do pesquisador. A performance do acesso, em diferentes situações e cenários, com diferentes atores humanos e não-humanos, é fundamental para construir diferentes identidades do pesquisador no campo e ajuda a determinar as suas possibilidades de interagir, de observar, de participar e consequentemente, de construir dados e de compreender uma “dada realidade”.
ALCADIPANI, Rafael. Confissões Etnográficas: Fracassos no Acesso a Organizações no Brasil. Revista Brasileira de Estudos Organizacionais, v.1, n.1, p.1-25, jan.-jul. 2014. SCHATZKI, T. R. The site of the social: a philosophical account of the constitution of social life and change. Pennsylvania: Pennsylvania State University, 2002. VAN MAANEN, J. Tales of the field: on writing ethnography. Chicago, University of Chicago Press, 1988. YBEMA, S. et al. (eds). Organizational Ethnography: Studying the complexities of everyday life. London: Sage, 2009.