Resumo

Neste artigo realiza-se a distinção do uso do termo carisma na análise da liderança. Na visão psicológica o carisma significa uma característica da personalidade do líder, captado por meio de análises de percepções. Já na abordagem sociológica weberiana o carisma se manifesta como é uma característica da relação social, constituindo um tipo de dominação legítima. A revisão da literatura possibilita delimitação do termo carisma em três variações de uso. Aqui, explora-se a transformação do carisma genuíno em antiautoritário estudando lideranças sindicais brasileiras.

Neste artigo partiu se do seguinte questionamento: o uso corrente do termo carisma é coerente com a visão sociológica utilizada por Max Weber na análise das estruturas de dominação? Para responder a este problema, teve-se o objetivo de promover a distinção entre os dois tipos possíveis de uso de termo carisma na visão sociológica weberiana (genuíno e antiautoritário) na análise da liderança, analisando uma situação real.

Na forma genuína, a dominação carismática é de caráter extra cotidiano. É uma relação social estritamente pessoal determinada pelo reconhecimento pelos adeptos de qualidades pessoais do dominador e à prova destas. Se vencer a transitoriedade, ela assume o caráter de uma relação permanente, tradicionaliza-se ou racionaliza-se. O objetivo é a manutenção da comunidade carismática noutra forma. A este processo Weber chama de rotinização, cujo efeito é a transformação do carisma puro em antiautoritário. É este o carisma observado em organizações de caráter permanente (Weber, 2004).

Este artigo apresenta um recorte de estudo interpretativo, segundo a visão weberiana, das relações sociais entre sindicalistas brasileiros. A pesquisa foi estruturada em duas etapas: exploratória e explicativa. A etapa exploratória foi realizada em duas inserções em 2011 e 2012. Foram realizadas 26 entrevistas semiestruturadas com representantes dos sindicatos de trabalhadores e empregadores. A etapa explicativa, de natureza documental, foi desenvolvida entre maio e setembro de 2014 apenas em instituições de representação de trabalhadores, quando foram selecionados e avaliados 115 documentos.

A análise documental evidenciou que as ações dos formadores sindicais fixaram as ideias e os comportamentos que sedimentaram o terreno para emersão de lideranças carismáticas, num sentido inverso daquele descrito por Weber em ES. Ficou evidente que o carisma identificado em sindicatos brasileiros não se enquadra nas características do carisma genuíno, mas da sua interpretação antiautoritária, que pode conviver com estruturas cotidianas. Sindicatos apresentam formas típicas de estruturas burocráticas ou tradicionais. Neles, o líder carismático divide o poder com o quadro administrativo.

Na rotinização do carisma o poder é expropriado pelo quadro administrativo. Os dispositivos de administração e de organização criados por este quadro garantem a sobrevivência da associação. Estabelecem regras internas para o uso do poder limitando-o às atribuições do cargo ou do mandato. Por isto, a ação do líder é limitada, obedecendo ao escopo de uma representação, não de uma apropriação, e que somente mediante manobras políticas ou golpes, o poder se torna pleno por algum espaço de tempo, sendo depois restabelecida a normalidade de divisão do poder do líder com o quadro administrativo.

Burns, J. M. (2003). Transforming leadership: a new pursuit of happiness. New York: Atlantic Monthly Press. Weber, Max (1999). Metodologia das ciências sociais, v. 1 e 2, 3ed. São Paulo: Cortez; Campinas, SP: Editora da Universidade Estadual de Campinas. Weber, Max (2004). Economia e sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva. V. 1 e v. 2, DF: Universidade de Brasília; São Paulo: Imprensa Oficial. Manfredi, S. M. (1996). Formação Sindical no Brasil: história de uma prática cultural. São Paulo: Escrituras Editora, 212 p.