1 - Ronan Romao de Freitas Vieira PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS (PUC MINAS) - PPGA - Programa de Pós-Graduação em Administração
2 - Simone Costa Nunes PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS (PUC MINAS) - Programa de Pós-graduação em Administração
Reumo
Desde o início da epidemia do HIV/AIDS, uma série de estigmas foi associado à doença e historicamente se converte em obstáculos e injustiças à vida dessa pessoa. O contexto do trabalho é, nesse cenário, relevante espaço para análise e discussão dos impactos dessa doença, pois são frequentes os relatos que evidenciam violência e desrespeito pelos quais passam o trabalhador soropositivo. Propomos, portanto, aqui uma discussão que dê voz ao trabalhador soropositivo que, em função do estigma da doença vivencia prejuízos de diversas ordens e não encontra espaço apropriado para apoiar-se.
Na presente empreitada, questionamos: De que maneira o estigma impacta o trabalhador soropositivo e influencia seus sentimentos e experiências no local de trabalho? E comprometemo-nos com o objetivo de investigar a vivência e os sentimentos de trabalhadores soropositivos considerando o estigma associado a eles no local de trabalho.
Poderosos estigmas historicamente associados ao HIV/AIDS implicam na discriminação da pessoa soropositiva, especialmente no local de trabalho (Parker & Aggleton, 2001; Brasil, 2018). Estigmas seriam marcas de descrédito (Martin, 1986), ou como nas palavras de Goffman (1988, p.6), o autor seminal deste construto: um “atributo profundamente depreciativo” para aquele que o possui e que, de maneira extremamente eficiente, dá lugar e naturaliza o que é diferente e o que é normal, ao passo que a sociedade muitas vezes não questiona a produção da desigualdade que decorre disso (Becker & Arnold, 1986)
A presente empreitada se configura em pesquisa qualitativa com coleta de informações estruturada em entrevistas em profundidade seguida de análise de conteúdo. Foi composto um grupo de estudo de 13 trabalhadores que vivem com HIV/AIDS entre um e 12 anos, sendo 11 homens e duas mulheres, com idade entre 20 e 55 anos, com escolaridade do ensino fundamental ao ensino superior, que atuam em organizações públicas e privadas da região metropolitana de Belo Horizonte. O estudo recebeu o identificador: CAAE 68498317.6.3001.5651 após aprovação no CONEP e Comitês de Ética da PUC Minas e SUS Betim.
O trabalhador soropositivo vive sob uma série de temores em torno do estigma da doença que carregam e esses temores parecem se intensificar no local de trabalho. O contexto organizacional, de onde quase sempre se espera a impessoalidade e o retorno financeiro, não parece ser terreno apropriado para demonstrar sinais que remetam aos estigmas de um doente de AIDS. Os resultados revelam que o medo de ser estigmatizado em função dessa doença converte-se em sofrimento e adoecimento no local de trabalho, quase sempre administrados em silêncio, ainda que aptos para a atividade laboral.
De certa forma, a boa condição para o trabalho interrompe o temor dessa doença que antes anunciava uma morte prematura. Talvez por esse motivo seja tão importante, para o trabalhador soropositivo, afirmar-se como alguém apto para o trabalho e distante de uma figura adoecida. Imaginamos que a possibilidade de viver bem e em condição de trabalhar sem qualquer limitação decorrente da doença é uma conquista extremamente significativa para essas pessoas. Percebemos que: inexistindo a cura, a possibilidade de trabalhar é o que mais se aproxima dela. Mas para tanto, o silêncio é um forte aliado.
Brasil (2018). Ministério da Saúde. Boletim Epidemiológico HIV/AIDS - 2018. Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais. Brasília.
Becker, G., & Arnold, R. (1986). Stigma as a social and cultural construct. In: S. C. Ainlay, G. Becker, & L. M. Colman (ed). The Dilemma of Difference. New York: Plenum Springer US (pp. 39-57).
Parker, R., & Aggleton, P. (2001). Estigma, discriminação e AIDS. Coleção ABIA. Cidadania e Direitos, 1. Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS.
Goffman, E. (1988). Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada.