1 - Carlos Cesar de Oliveira Lacerda UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ (UECE) - Programa de Pós-Graduação em Administração
2 - Ana Silvia Rocha Ipiranga UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ (UECE) - PPGA
3 - Ulf Thoene Universidad de La Sabana - EICEA
Reumo
Na cidade de Fortaleza, para além da urbe turística, observa-se características que demonstram espaços marcados por vulnerabilidades oriundos de diferentes processos históricos de marginalizações urbanas. Alguns autores discutiram estas questões relacionadas a fragmentação socioespacial da cidade de Fortaleza, enfatizando um processo de transformação histórica e modernização da cidade em busca do progresso. Baseando-se em uma lógica econômica, esses processos potencializaram um paradoxo urbano, evidenciando questões relativas a uma organização capitalista da cidade, por meio da gentrificação.
Diante do exposto, este trabalho questiona: como ocorreu o organizar das margens da cidade de Fortaleza? Ao considerar esta questão, essa pesquisa defende a proposição da existência de um nexo histórico que atuou/atua na fragmentação espacial da cidade, organizando as margens urbanas de Fortaleza por meio das ruínas, representadas neste estudo pelos campos de concentração. Nosso objetivo foi, portanto, compreender, sob o ponto de vista histórico, como ocorreu o organizar das margens da cidade de Fortaleza.
Em termos teóricos, o trabalho encontra-se na conjunção entre as discussões sobre a cidade nos estudos organizacionais (Mac-Allister, 2004; Fischer, 1997) e a abordagem da história na administração (Clark & Rowlinson, 2004) que se apoiou, entre outros autores, nos conceitos de Walter Benjamin (1892-1940), formulados em suas célebres teses “Sobre o Conceito de História” (2016), publicadas originalmente em 1940. Benjamin (2018) considerou que os conceitos de “progresso” e de “ruína” são dois lados de uma mesma moeda.
O objetivo do estudo nos direcionou para uma pesquisa de caráter histórico, por meio do qual foi constituída uma coleção de arquivos documentais (Barros, 2016; Carter, 2006; Decker, 2013). Ao final, foram contabilizados um total de 193 arquivos documentais que organizaram a coleção documental da presente pesquisa. O processo de análise foi realizado à luz da historiografia por meio de um conjunto de procedimentos relacionados a “escrita da história” segundo Michel de Certeau (1988).
Este estudo questionou a crença no “progresso” da cidade a partir da perspectiva das “ruínas”, representadas por um não-lugar originário de um passado misterioso (Certeau, 1988), relacionado à história das práticas governamentais de exceção de confinamento nos campos de concentração de migrantes das estiagens. Esses processos atribuíram novos significados à organização atual das margens da cidade de Fortaleza, indicando a impossibilidade de vislumbrar um futuro, enquanto essa crítica ao presente não se concretizar.
Os relatos históricos nos apresentaram “lições da história” no sentido de iluminar as diferentes versões de um passado, visando compreender o presente e imaginar um futuro relacionado aos processos de organização da cidade, bem como repensar caminhos alternativos para aqueles que são treinados para gerenciá-los. Através da reativação da memória de um passado circunstancial, o olhar das ruínas confrontou-se com os relatos oficiais, abrindo espaços onde novas possibilidades para a cidade podem ser imaginadas.
Barros, A. (2016). Archives and the “Archive”: dialogue and an agenda of research in organization studies. Organizações & Sociedade, 23(79), 609-623.
Benjamin, W. (2016). O Anjo da História (Gsammelte Schriften). Belo Horizonte: Autêntica.
Clark, P., & Rowlinson, M. (2004). The treatment of history in organization studies: towards an ‘historic turn’? Business History, 46(3), 331-352.
De Cock, C., & O’Doherty, D. (2016). Ruin and organization studies. Organization Studies, 38(1).
Mac-Allister, M. (2004). A cidade no campo dos estudos organizacionais. Organizações & Sociedade, 11, 171-181.