Resumo

O sistema econômico vigente gera problemas complexos e multidimensionais na sociedade, o Estado não consegue sana-los. Urge enfrentar os vazios institucionais que emergem em territórios periféricos com ação coletiva. Enfrentando os desafios de forma inovadora é possível transformar a realidade de determinada população. A Teoria da Inovação Social Transformadora (TSI) Avelino et al. (2014, 2019) ao ser contextualizada com dois movimentos contra hegemônicos no Pantanal-MT e na Amazônia-RO permite evidenciar elementos e categorias que melhoraram as condições de vida dessas comunidades.

A economia solidária fez emergir uma concepção democrática de TSI disruptivo e contra-hegemônico que favorece a politização e as alternativas promotoras da participação comunitária, o destaque do Reca e da Agroana Girau instiga a questionar. Que elementos indicam que a inovação social pode ser transformadora de uma realidade socioambiental local? O objetivo do artigo é identificar elementos recorrentes no Projeto Reca e no Assentamento Agroana Girau, que revelam uma inovação social transformadora (TSI) de acordo com as quatro categorias trabalhadas por Avelino et al. (2014, 2019).

A Teoria da Inovação Social Transformadora (Transformative Social Innovation – TSI) (AVELINO et al., 2019; PEL et al., 2020) constrói uma estrutura relacional integrando recursos teóricos de diferentes áreas para formar uma visão multidimensional dos problemas complexos. A pesquisa parte da amplitude da IS (MULGAN et al., 2007; MULGAN, 2010; BIGNETTI, 2011; MONTEIRO, 2019) e dos Ecossistema de Inovação Social (ADNER, 2017; ADNER & FEILER, 2019) para analisar sistematicamente quatro categorias: a inovação social, o sistema de inovação, a mudança de chave e as narrativas de mudança.

A pesquisa se configura como qualitativa (CRESWELL, 2010) sob a abordagem exploratória (MALHOTRA, 2012), posto o objetivo de investigar os elementos que caracterizam uma inovação social transformadora nas realidades estudadas. Para tal, utilizou-se o método do estudo de caso (YIN, 2016), com base em dados secundários (materiais acadêmicos) sobre os dois casos escolhidos por decisão coletiva entre os autores. A análise se deu pela técnica de análise de conteúdo (BARDIN, 1977) à luz das quatro categorias da TSI: inovação social, sistema de inovação, mudança de chave e narrativas de mudança.

Em cada caso, foi possível identificar evidências das quatro categorias da TSI, a partir do processo histórico-social de cada projeto. Apesar de realidades distintas, há elementos recorrentes tanto no Agroana Girau, quanto no Projeto Reca. As mudanças macroambientais, as novas configurações do ecossistema e as novas soluções transformadoras, como os modelos SAF e CSA, apresentam um cenário de transformação a partir da articulação democrática das populações migrantes e dos povos locais.

Encontrou-se elementos que evidenciam a inovação social transformadora ao longo do processo histórico-social em ambos os projetos. As novas articulações sociais com as instituições, a relação dos atores entre si e com a terra e os modelos produtivos são ressignificados para produzir o bem-estar social coletivo. De forma democrática, as populações assumiram o protagonismo de suas realidades, reconfiguraram os processos locais e desenvolveram soluções para transformar suas situações vulneráveis.

AVELINO, F. et al. Transformative social innovation and (dis)empowerment. Technological Forecasting and Social Change, 2019. BIGNETTI, L. P. As inovações sociais: uma incursão por ideias, tendências e focos de pesquisa. Ciências Sociais Unisinos, 2011. HAXELTINE, A. et al. A Framework for transformative social innovation. TRANSIT Working Pape, 2016. MONTEIRO, A. O que é a Inovação social? Maleabilidade conceitual e implicações práticas. Dados, 2019. PEL, B. et al. Towards a theory of transformative social innovation: A relational framework and 12 propositions. Research Policy, 2020.