Resumo

Os programas de residência caracterizam-se por um processo de desenvolvimento marcado por 60 horas semanais de trabalho e estudo, com pouco tempo para o descanso, cobranças intensas, distanciamento dos amigos e da família e poucas oportunidades de lazer, que podem levar ao desequilíbrio físico e mental, incorrendo em prejuízo à qualidade de vida. Dentre as consequências físicas da falta de qualidade de vida estão as somatizações álgicas e complicações osteomioarticulares. Outra reação comum é a tendência a fechar-se em si mesmo e isolar-se do mundo exterior, potencializando a depressão.

Quais fatores associados aos programas de residência multiprofissional afetam a qualidade de vida dos profissionais de saúde? Essa é pergunta que deu origem à presente pesquisa. Muitos estudos têm avaliado a qualidade de vida e estresse em residentes médicos, no entanto, poucos foram encontrados que avaliassem estes aspectos em residentes multiprofissionais (Moreira et al., 2016). Visando cobrir tal lacuna esta pesquisa teve como objetivo analisar a qualidade de vida dos residentes de um Programa Integrado Multiprofissional do Hospital das Clínicas da UFMG.

Segundo Cousins (1991), o treinamento no formato da residência pode ser comparado a um teste de resistência, dado a capacidade de despertar quadros ansiogênicos e reações disfóricas. Estudo conduzido por Cahú et al. (2014) com 45 residentes multiprofissionais, revelou que eles estavam em situação elevada de estresse. Carvalho e Malagris (2007) encontraram resultados semelhantes, indicando a desgaste físico e cansaço constantes. Pesquisa de Cavalcanti et al. (2018), com 46 residentes identificou a presença de depressão, com aumento significativo da incidência ao longo do programa de residência.

O método adotado foi o survey transversal e descritivo, realizado com 55 participantes do Programa de Residência Integrada Multiprofissional do Hospital das Clinicas da UFMG. Os dados foram coletado por meio de questionário WHOQOL-Bref, composto por 26 questões, respondido por 265 médicos-residentes. Para a análise dos dados recorreu-se à estatística descritiva, com destaque para a média e desvio-padrão. Como não foi intenção da pesquisa buscar diferenças entre grupos constituídos, não foi necessário recorrer à estatística inferencial.

Os dados revelam que o melhor desempenho foi obtido pelo domínio relações sociais, seguido dos domínios meio ambiente e psicológico, constituindo um quadro em que os residentes se percebem em situação de não insatisfação nem satisfação com sua qualidade de vida. O pior desempenho foi registrado no domínio físico, assumindo uma condição de insatisfação com a qualidade de vida. Identificou-se também a percepção de insatisfação com a qualidade e de vida de modo geral e com a sua saúde. As facetas com melhores resultados foram: capacidade de concentração e satisfação consigo mesmo.

Os resultados apontam para o comprometimento da qualidade de vida dos profissionais de saúde em todos os domínios do Whoquol. Os resultados mostram uma percepção de insatisfação com a qualidade de vida, com escores bastante preocupantes quanto à segurança, lazer, transporte, satisfação com a capacidade de desempenhar as atividades do seu dia-a-dia e concentração. Alertamos, para a necessidade de monitorar e desenvolver ações preventivas. Sugerimos para futuros estudos a relação de entrevistas para aprofundar o entendimento dos sintomas físicos e comportamentais decorrentes da QV.

Cahú, G. et al. (2014). Estresse e qualidade de vida em residência multiprofissional em saúde. Rev Bras de Terapias Cognitivas, 10(2), 76-83. Cavalcanti, I.S. et al. (2018). Burnout e depressão em residentes de um programa multiprofissional em oncologia: estudo longitudinal prospectivo. Rev Brasil de Edu Médica, 42(1),190-198. Carvalho, L., & Malagris, L. (2007). Avaliação do nível de stress em profissionais de saúde. Estudos e Pesquisas em Psicologia, 7(3), 570-582. Cousins, N. (1981). Internship: preparation or hazing? Journal of the American Medical Association, 245(4), 154-16.