Resumo

As entidades sem finalidade de lucro – ESFL (incluindo as Fundações Privadas) – têm caráter de prestação de serviços públicos. Assim deveriam ter suas prestações de contas abertas e de acesso amplo. A transparência é também requerida em decorrência das isenções fiscais e tributárias que têm. Devido a isso, deixam de ter direito à total privacidade em relação às suas movimentações financeiras, e passam a ser obrigadas a prestar contas à sociedade como um todo, da mesma forma que os órgãos governamentais devem expor suas contas.

A intenção do presente estudo era analisar as prestações de contas de fundações privadas brasileiras, mas uma questão anterior surgiu: onde podem ser encontrados estes demonstrativos? Não deveriam ser eles públicos, de amplo acesso? Assim, o objetivo primário se tornou verificar como obter as demonstrações financeiras das fundações privadas brasileiras, recorte necessário devido à falta de acesso maior ainda em relação a outros tipos de organizações sem fins lucrativos.

Para Milani Filho (2008, p. 7) em relação às organizações do terceiro setor, "num ambiente altamente competitivo por recursos escassos (doações e subvenções), a credibilidade é fator decisivo para a captação de itens monetários e não-monetários" – e isso se relaciona diretamente com a transparência não só nos serviços oferecidos mas também nas prestações de contas sobre eles. A falta de transparência pode levar o público a tomar a parte pelo todo, fazendo com que alguns mal-intencionados prejudiquem aqueles que realmente se dedicam a seus fins sociais (GRAZZIOLI; RAFAEL, 2013).

A metodologia empregada para a verificação da transparência na obtenção das demonstrações financeiras das fundações privadas brasileiras foi o envio de comunicação eletrônica por meio do formulário de abertura de processo administrativo do site de cada MP Estadual. As páginas da internet de todos os MPs consultados possuíam banner com a logomarca da "Transparência Ministério Público" e do "SIC – Serviço de Informação ao Cidadão". Ou seja, havia um mecanismo oficial para a solicitação das informações desejadas para essa pesquisa, o que parecia indicar que seria possível obtê-las.

Foram obtidas as demonstrações financeiras das fundações privadas de apenas dois estados dentre os vinte estados consultados (10%), o que reforça a falta de transparência de entidades do terceiro setor brasileiro. Mesmo daquelas organizações cujos órgãos fiscalizadores públicos recebem com regularidade as prestações de contas, não é permitido o acesso às informações. Na maioria dos casos, apesar de reconhecerem a legitimidade do pedido, os MPs alegaram não ter pessoal para realizar a operação de extração e de envio dos dados que constavam do programa Sicap.

Por conta das restrições ao acesso às informações das fundações privadas, não é possível diminuir a assimetria informacional por meio da transparência como identificou Milani Filho (2008), Grazzioli e Rafael (2013) e Reid (2018). Ou seja, apesar da sociedade contribuir com o funcionamento das organizações sem fins lucrativos, ela não tem como verificar o que é feito com os valores aportados. No caso das fundações privadas, há uma transparência assimétrica, visto que apenas os MPs de cada estado federativo é que tomam conhecimento de seu funcionamento financeiro.

GRAZZIOLI, A.; RAFAEL, E. J. Fundações privadas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2013. HYNDMAN, N.; MCCONVILLE, D. Trust and accountability in UK charities: exploring the virtuous circle. The British Accounting Review, v. 50, p. 227-237, 2018. MILANI FILHO, M. A. F. Transparência e opacidade no terceiro setor: a divulgação financeira de organizações filantrópicas. In: XV Congresso Brasileiro de Custos, Curitiba - PR, Anais eletrônicos..., 2008. REID, R. J. Foundation Transparency: Opacity — It’s Complicated. The Foundation Review, v. 10, n. 1, article 10, 2018.